Reflexão Litúrgica – 28/13/2025: (Mateus 2, 13-15.19-23)
O Evangelho de Mateus nos coloca diante de uma cena que atravessa os séculos. A fuga para o Egito não é apenas um episódio da infância de Jesus, mas a revelação de um conflito permanente entre o Reino de Deus e os sistemas que se sustentam no medo e na dominação.

Herodes não teme uma criança por acaso, mas sim aquilo que ameaça sua lógica de poder, porque o nascimento da Palavra Encarnada inaugura uma história que não se curva aos palácios. Herodes representa um sistema que se sente ameaçado sempre que a verdade ganha corpo, não sendo seu medo espiritual mas político; não é religioso mas estrutural.
O Evangelho deixa claro que, quando o poder se absolutiza, qualquer sinal de justiça se torna intolerável. Por isso a perseguição, a violência, a tentativa de eliminar o Cristo ainda em sua fragilidade. Maria e José não discutem com Herodes, nem tentam reformar o palácio, mas escutam, levantam-se de noite e partem.
A noite, no texto bíblico, é o espaço da incerteza, do risco e da ausência de garantias, e mesmo assim eles escolhem o caminho que preserva a vida. Permanecer seria compactuar; sair é um ato de fé concreta, silenciosa e profundamente comprometida com o projeto de Deus.
O Egito, antiga terra de escravidão, transforma-se em lugar de refúgio. Isso revela que o problema nunca foi apenas o território, mas o sistema que governa, e quando o poder se fecha sobre si mesmo e se torna incapaz de acolher a vida, até os espaços marcados pela dor podem parecer mais seguros do que os centros religiosos capturados pela violência e pelo medo.
Os Herodes de hoje continuam ativos. Eles se manifestam em estruturas econômicas que sacrificam vidas, em discursos religiosos que silenciam o Evangelho, em sistemas políticos que criminalizam os pobres e protegem privilégios. Sempre que a Palavra Encarnada ameaça desinstalar essas lógicas, o medo reaparece, e com ele novas formas de perseguição, muitas vezes travestidas de ordem, legalidade ou falsa piedade.
A Palavra Encarnada continua passando pela história no rosto dos excluídos, nos moradores de rua, na fragilidade dos pequenos, dos idosos, na vida dos perseguidos e na dor silenciosa daqueles que sofrem pela depressão clamando por cuidado, presença e acolhida, longe dos palácios e das lógicas do poder.
Diante dos Herodes e de seus palácios do nosso tempo, escolhemos permanecer com o Cristo vivo ainda que isso nos custe segurança, reconhecimento e pertencimento, ou preferimos ficar onde o sistema nos oferece conforto ao preço do silêncio do Evangelho?
Paz e Bem
Juarez Fernandes (Especialista em Cristologia e Membro do Conselho Fiscal da Rádio Alvorada)