Leão XIV, em seu primeiro grande documento, diz que os pobres evangelizam os fiéis

Leão XIV, em seu primeiro grande documento, diz que os pobres evangelizam os fiéis

No primeiro grande documento de seu pontificado, o papa Leão XIV diz que os pobres não são só objetos de caridade, mas evangelistas que podem levar os fiéis à conversão por meio de seu exemplo de fraqueza e confiança em Deus. 

“Os pobres podem ser para nós como mestres silenciosos, reconduzindo o nosso orgulho e a nossa arrogância a uma conveniente humildade”, escreve Leão XIV em Dilexi te (Eu te amei), publicado hoje (9).

“O idoso, por exemplo, com a fragilidade do seu corpo, lembra-nos a nossa vulnerabilidade, ainda que a tentemos esconder por trás do bem-estar ou das aparências”, escreve o papa. “Além disso, os pobres fazem-nos refletir sobre a inconsistência daquele orgulho agressivo com que muitas vezes enfrentamos as dificuldades da vida. Em suma, eles revelam a nossa precariedade e o vazio de uma vida aparentemente protegida e segura”.

O papa cita seu antecessor, o papa Francisco, ao longo do documento, que foi redigido pela primeira vez no pontificado anterior e se baseia fortemente na primeira exortação apostólica do papa argentino, Evangelii gaudium, sobre a alegria do Evangelho. Uma exortação apostólica é um dos gêneros mais importantes do magistério papal, tipicamente focado na aplicação pastoral da doutrina.

Toda a vida de Cristo é um exemplo de pobreza, escreve o papa Leão XIV, e a Igreja, se quiser pertencer a Cristo, deve dar aos pobres um lugar privilegiado.

“Para os cristãos, os pobres não são uma categoria sociológica, mas a própria carne de Cristo”, escreve Leão XIV. “O Senhor se faz carne que tem fome e sede, que está doente e na prisão”.

Documento herdado do papa Francisco

O papa Leão XIV assinou a exortação em 4 de outubro, festa de são Francisco de Assis, tradicionalmente conhecido como Il Poverello (O Pobrezinho).

O papa diz no início do documento que o recebeu como herança do papa Francisco, que estava trabalhando nele nos últimos meses de sua vida.

O documento traça a doutrina da Igreja sobre os pobres, baseando-se no Antigo e Novo Testamento, na prática da comunidade cristã primitiva, nos escritos dos Padres e Doutores da Igreja, nas vidas dos santos, nos documentos do concílio Vaticano II e no magistério dos papas desde são João XXIII.

Leão XIV também elogia o exemplo de ordens religiosas contemplativas e ativas ao longo da história que ajudaram os pobres com saúde, alimentação, abrigo e educação.

“Toda a renovação eclesial sempre teve entre as suas prioridades esta atenção preferencial pelos pobres, que se diferencia, tanto nas motivações como no estilo, da atividade de qualquer outra organização humanitária”, escreve o papa.

O progresso tecnológico não erradicou a pobreza, que continua a se manifestar de várias maneiras, escreve Leão XIV. Ele define os pobres como os encarcerados, as vítimas de exploração sexual, os afetados pela degradação do meio ambiente e os migrantes.

“A Igreja, como mãe, caminha com os que caminham. Onde o mundo vê ameaça, ela vê filhos; onde se erguem muros, ela constrói pontes”, diz o papa. “Pois sabe que em cada migrante rejeitado, é o próprio Cristo que bate às portas da comunidade”.

Falta de cuidados materiais e espirituais

Leão XIV fala sobre preconceitos que, segundo ele, podem levar os cristãos a negligenciar seu dever para com os pobres.

“Há quem continue a dizer: o nosso dever é rezar e ensinar a verdadeira doutrina”, escreve ele. “Mas, desvinculando esse aspecto religioso da promoção integral, acrescentam que só o governo deveria cuidar deles, ou que seria melhor deixá-los na miséria e ensinar-lhes antes a trabalhar”.

“Assumem-se, às vezes, critérios pseudocientíficos para dizer que a liberdade do mercado levará naturalmente à solução do problema da pobreza”, ou que os ricos podem implementar soluções mais eficazes, escreve o papa.

Leão XIV diz que tais visões são mundanas e superficiais, “com critérios superficiais e desprovidos de qualquer luz sobrenatural”.

Dilexi te também enfatiza as necessidades espirituais dos pobres, dizendo que elas são mais importantes que as materiais, mas muitas vezes são ignoradas pela Igreja.

“Não estamos falando só da assistência e do necessário compromisso com a justiça”, escreve o papa Leão XIV, citando o papa Francisco. “Os fiéis devem responder também por uma outra forma de incoerência em relação aos pobres. Na verdade, a pior discriminação que sofrem os pobres é a falta de cuidado espiritual”.

Leão XIV termina sua exortação enfatizando o dever da esmola, que ele diz ter caído em desuso, mesmo entre os fiéis. 

“A esmola, mesmo que pequena, infunde pietas numa vida social em que todos se preocupam com o seu próprio interesse pessoal”, diz ele, dizendo também que, embora não seja a solução para a pobreza no mundo, tocará os corações dos fiéis.

“O amor e as convicções mais profundas devem ser alimentados, e isso faz-se com gestos”, diz também o papa Leão XIV. “Permanecer no mundo das ideias e das discussões, sem gestos pessoais, frequentes e sinceros, será a ruína dos nossos sonhos mais preciosos. Por essa simples razão, como cristãos, não renunciamos à esmola. Um gesto que pode ser feito de várias maneiras, e podemos tentar fazer de forma mais eficaz, mas que deve ser feito. E será sempre melhor fazer alguma coisa do que não fazer nada”.

Fonte: ACI Digital

Créditos da Imagem: Site Vatican News